segunda-feira, 9 de novembro de 2009

História da Maria Castanha








História da Maria Castanha






O céu estava cinzento e quase nunca aparecia o sol, mas enquanto não chovia os meninos iam brincar para o jardim.



Um jardim muito grande e bonito, com uma grade pintada de verde toda em volta, de modo que não havia perigo de os automóveis entrarem e atropelarem os meninos que corriam e brincavam à vontade, de muitas maneiras: uns andavam nos baloiços e nos escorregas, outros deitavam pão aos patos do lago, outros metiam os pés por entre as folhas secas e faziam-nas estalar – crac,crac – debaixo das botas, outros corriam de braços abertos atrás dos pombos, que se levantavam e fugiam, também de asas abertas.



Era bom ir ao jardim. E mesmo sem haver sol, os meninos sentiam os pés quentinhos e ficavam com as bochechas encarnadas de tanto correr e saltar.



Uma vez apareceu no jardim uma menina diferente: não tinha bochechas encarnadas, mas uma carinha redonda, castanha, com dois grandes olhos escuros e brilhantes.



- Como te chamas? – perguntaram-lhe.

- Maria. Às vezes chamam-me Maria Castanha .

- Que engraçado, Maria Castanha! Queres brincar?

- Quero.



Foram brincar ao jogo do apanhar.

A Maria Castanha corria mais do que todos.



- Quem me apanha? Ninguém me apanha!

- Ninguém apanha a Maria Castanha!



Ela corria tanto. Corria tanto que nem viu o carrinho do vendedor de castanhas que estava à porta do jardim, e foi de encontro a ele.

Pimba!

O saco das castanhas caiu e espalhou-as todas à reboleta pelo chão.

A Maria Castanha caiu também e ficou sentada no meio das castanhas.



- Ah. Minha atrevida! – gritou o vendedor de castanhas todo zangado.

- Foi sem querer – explicaram os outros meninos.

- Eu ajudo a apanhar tudo – disse Maria Castanha, de joelhos a apanhar as castanhas caídas.



E os outros ajudaram também.

Pronto. Ficaram as castanhas apanhadas num instante.



- Onde estão os teus pais? – perguntou o vendedor de castanhas à Maria Castanha.

- Foram à procura de emprego.

- E tu?

- Vinha à procura de amigos.

- Já encontraste: nós somos teus amigos – disseram os meninos.

- Eu também sou – disse o vendedor de castanhas.



E pôs as mãos nos cabelos da Maria Castanha, que eram frisados e fofinhos como a lã dos carneirinhos novos.

Depois, disse:



- Quando os amigos se encontram é costume fazer uma festa. Vamos fazer uma festa de castanhas. Gostam de castanhas?

- Gostamos! Gostamos! – gritaram os meninos.

- Não sei. Nunca comi castanhas, na minha terra não há – disse Maria Castanha.

- Pois vais saber como é bom.



E o vendedor deitou castanhas e sal dentro do assador e pô-lo em cima do lume.

Dali a pouco as castanhas estalavam… Tau! Tau!



- Ai, são tiros? – assustou-se a Maria Castanha, porque vinha de uma terra onde havia guerra.

- Não tenhas medo. São castanhas a estalar com o calor.



Do assador subiu um fumozinho azul-claro a cheirar bem.

E azuis eram agora as castanhas assadas e muito quentes que o vendedor deu à Maria Castanha e aos seus amigos.



- É bom é – ria-se Maria Castanha a trincar as castanhas assadas.

- Se me queres ajudar podes comer castanhas todos os dias. Sabes fazer cartuchos de papel?



A Maria Castanha não sabia mas aprendeu.

É ela quem enrola o papel de jornal para fazer os cartuchinhos onde o vendedor mete as castanhas que vende aos fregueses à porta do jardim.



Maria Isabel Mendonça Soares, in "Contos no Jardim”.

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